
quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
sexta-feira, 7 de dezembro de 2007
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
sexta-feira, 26 de outubro de 2007
"Sem título e bastante breve"
tento descobrir um cruzar de linhas misteriosas, e
com elas quero construir um templo em forma de ilha
ou de mãos disponíveis para o amor....
na verdade, estou derrubado
sobre a mesa em fórmica suja duma taberna verde,
não sei onde
procuro as aves recolhidas na tontura da noite
embriagado entrelaço os dedos
possuo os insectos duros como unhas dilacerando
os rostos brancos das casas abandonadas, à beira mar...
dizem que ao possuir tudo isto
poderia ter sido um homem feliz, que tem por defeito
interrogar-se acerca da melancolia das mãos....
... esta memória lâmina incansável
um cigarro outro cigarro
vai certamente acalmar-me
.... que sei eu sobre as tempestades do sangue?
E da água? no fundo, só amo o lodo escondido das ilhas...
amanheço dolorosamente, escrevo aquilo que posso
estou imóvel, a luz atravessa-me como um sismo
hoje, vou correr à velocidade da minha solidão.
Al Berto
terça-feira, 23 de outubro de 2007
quarta-feira, 17 de outubro de 2007
sexta-feira, 12 de outubro de 2007
quarta-feira, 19 de setembro de 2007
sexta-feira, 14 de setembro de 2007
De um para outro lado
de um lado para o outro lado do espelho
se me quiseres
inteira
comum
válida
transporto o mar dos meus olhos
para o vidro que te separa da minha forma frágil
entra-me pele dentro
o toque áspero da tua mão
de duração mínima
entra-me pele dentro
o ar vigilante com que me condenas
a um cárcere ínfimo
se me deixares fujo
para onde a minha imagem não possa ser aprisionada
se me quiseres
ausente
imortal
como memória
escondo o verde traiçoeiro que carrego
no azul tranquilo de outro elemento
Do que gosto...
… de esperar pouco tempo, após marcar um encontro;
… do cheiro da terra depois de ter chovido, preferencialmente no Verão;
… da minha cadela, companheira de brincadeira;
… de provocar um sorrisinho de esgar em mim mesma;
… de pipocas doces;
… de pantufas fofinhas;
… de ser predadora e não presa;
… de me surpreender;
… de escrever cartas longas;
… de sumo de laranja pela manhã;
… de música melancólica quando me sinto angustiada, ou de uma boa bateria quando estou furiosa;
… de filmes que me façam chorar;
… da gramática portuguesa;
… de conversar em voz baixa, deitada na cama;
… de uma banheira cheia de espuma;
… de andar descalça em areia molhada;
… da comida açoriana, das hortênsias a delimitarem os campos, dos touros soltos nas ruas;
… dos meus amigos, a quem não tenho de me explicar;
… de velas acesas no terraço e um copo de vinho aquecido;
… do meu diário actual;
… do silêncio confortável entre duas pessoas;
… de colorir desenhos;
… de cozinhar ao sábado à noite para quem aparecer;
… de girassóis com pé alto;
… de livros, muitos livros espalhados pela casa, como damas de companhia;
… de confidências madrugada fora;
… de bolo de bolacha, fresquinho;
… de gargalhadas sonoras;
… das planícies do alentejo, enquanto alguém me conduz;
… da independência do meu gato;
… de sotaques e da língua portuguesa;
… de ser só, no meio de toda a gente;
… de ser provocada;
… de comprar e oferecer presentes sem razão;
… de comer sushi, devagarinho;
… de canetas de tinta permanente;
… de jazz e bossa nova;
… de vozes que choram;
… de datar tudo:
… de olhares quietos;
… de mim toda;
… de chá preto, em todas as estações do ano;
… de escrever noite dentro;
… de pensar e dizer coisas simples;
… do sol imenso;
… de xaropes para a tosse, por vício;
… duma esplanada à beira-mar;
… da voz do Camané;
… de sair sem destino logo pela manhã;
… da paisagem que vejo da janela da biblioteca;
… de fechar os olhos e respirar se me sinto cansada;
… de camisolas grossas de lã no Inverno;
… de novas descobertas;
… do verde do Minho;
… de dormir sem luz e muito;
… de sentir alguém mexer-me no cabelo;
… de viajar com companhia;
… de ser assim, sem mais!!
quinta-feira, 13 de setembro de 2007
Dúvida Mínima
corro sem saber se
fora de mim existe estrada ou mulher
Penso nos gestos atirados aos outros
como amuletos que
fechados para o mundo me iludem os olhos
A pele cansada do sossego
desgasta-se sem remédio
ardendo no inferno da tua ausência em mim
Põe o sol no sítio e deixa-me estar quieta,
dizia-te eu
enquanto ainda possuía na garganta
a força do teu sopro em mim.
Seremos hoje as cinzas que ainda restam dos nossos corpos de ontem?
Abraço
descreves, talvez, os passos outrora marcados na areia
subscreves, com evidência, o que risco na água turva
e assinas a sangue, com fervor, o ar que nos rodeia.
O frágil gesto que me envias
com convicção
sem testemunha
tenta convencer-me a olhar o dia como um dia perfeito.
Mas hoje é dia de partida,
de despedida,
da suave paz do abandono voluntário…
longe de mim a vontade de ficar!
quarta-feira, 12 de setembro de 2007
Um dia...
Nas dúvidas atiradas pela janela de vidros sujos,
no desespero da manhã,
nos lençóis deixados em desordem?
Acreditas nos sons que te vêm de longe?
Nos rádios dos bares outrora ocupados,
no lento torpor da tarde,
no carro estacionado à porta de casa?
Acreditas no que vês agora?
Nas longas horas passadas num sofá deitado,
na espera ao fim do dia,
na lista telefónica a amarelecer?
Filipa Rodrigues
Sendo tu...
sou pedra e toque
gelo e água
vício terno
veneno suave
vaidade doce.
Calada a minha voz teima em obedecer-te
palavra e som
erva daninha
nota deslocada
e na noite perene, silêncio sem retorno.
Filipa Rodrigues
De todas as cores (improviso)
caminhas em cima de águas revoltas
por entre pedaços de pedras roxas;
Nos dias das cores todas
passas as horas nas vagas febris
do ouro a que me proibiste o acesso;
Hoje... neste dia carregado de sombra negra
nesta manhã de sol aparecido
escondes-te na vontade de me provocar.
Filipa Rodrigues
terça-feira, 11 de setembro de 2007
quase luz nenhuma

"em todos os retratos haverá um rastro de ferrugem
porque a demora corrói o olhar ... alinhava no papel
o ácido das noite em sépia
no vidro das montras pressentimos a fuga
o desabar da cidade sob o peso da chuva ... sempre
que o diálogo existe entre a sensibilidade do corpo
e do filme ... as mãos repetem os gestos
as palavras desfazem-se no luso-fusco surge o medo
estas pedras fascinadas pelos néons donde se solta a fera
que nos devassa os umbrais dos dias morrendo
caminhamos pela avenida miniaturizada no sonho
aqui devoramos os alicerces de quase luz nenhuma
aqui nos perdemos propositadamente ... a paula o paulo
e a silhueta duma gabardina preta comigo dentro
ao que dizemos e à noite amiga fico atento
hipnotizado nas luzes terríveis ... o receio
de mais tarde olhar as fotografias e já não sentir
pulsar no papel vida nenhuma"
Al Berto
quarta-feira, 5 de setembro de 2007
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.
O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
mármore distraído,
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Alexandre O`Neill
quarta-feira, 29 de agosto de 2007
terça-feira, 28 de agosto de 2007
sábado, 25 de agosto de 2007
Esperemos
estão fazendo-se
como o pão ou as cadeiras ou o
das farmácias ou das oficinas
- há fábricas de dias que virão
-existem artesãos da alma
que levantam e pesam e preparam
certos dias amargos ou preciosos
que de repente chegam à porta
para premiar-nos
com uma laranja
ou assassinar-nos de imediato."
Pablo Neruda (Últimos Poemas)
quinta-feira, 23 de agosto de 2007
Viagem
uma luz desmaiada
o pó da estrada.
No lento percurso da viatura
vês os dias correrem
na direcção oposta.
Fossem todos os propósitos vistos por dentro,
todas as fases esclarecedoras,
todos os sinais interpretados
e o silêncio deixaria de existir.
Desaparecessem todas as mágoas escondidas
e não estaríamos aqui
envoltos em penumbra e calor.
Filipa Rodrigues
quarta-feira, 22 de agosto de 2007
Improviso de Verão
a pedra mole
o fogo a saltar.
São dois corpos molhados
a areia a escorrer
a pele queimada.
Quando a porta se abre e me vês,
impaciente
irada
pronta a atacar,
já não sou menina doce.
Longe, os dias de intimidade
ainda nos restam na memória
e no corpo cansado.
Dois ou três movimentos… eu e tu!
Filipa Rodrigues
sábado, 18 de agosto de 2007
Beleza
By Agatha Katzensprung
"[...] A beleza é uma forma de génio...
diria mesmo que é mais sublime que o génio por não precisar de qualquer explicação.
É um dos grandes factos do mundo, como a luz do sol,
ou a primavera, ou o reflexo nas escuras águas dessa concha de prata a que chamamos lua.
É inquestionável. [...] "
In O Retrato de Dorian Gray, Oscar Wilde
quarta-feira, 15 de agosto de 2007
terça-feira, 14 de agosto de 2007
Dança
permanece fixa a tua presença,
obstinada,
alicia como quem despe com um olhar
os meus sentidos,
arrepia a minha vontade
como a lâmina de uma espada
e faz tremular a memória
ainda casta.
Inspiro o teu perfume que as paredes libertam
e a minha face ergue-se
à procura do teu beijo.
Não te alcanço.
O corpo vem por arrasto.
Não te alcanço!
Os braços estendem-se para abraçar as
partículas que ainda restam.
Não te toco!
Giro, volteio, revoluteio.
Não te encontro…
O delírio atira-me ao chão
mas a vontade ergue-me a face
à procura do teu beijo.
Vera Carvalho
domingo, 12 de agosto de 2007
estados
Uns tinham fugido de casa dos pais, outros tinham-se exilado voluntariamente do mundo. Viviam espalhados por apartamentos de subúrbio, ou tinham viajado por países distantes donde raramente regressavam. E, dos que ficaram, nenhum possuía uma ideia precisa daquilo que seria necessário fazer para não sucumbir em tamanha desolação. Nenhum deles tentara sequer explicar aos outros que estranho vazio se apoderara de si.
Restava-lhes a amizade e a cumplicidade de alguma paixão para resistirem ao caos devorador da cidade, e à moleza quase beata da "geração" a que se recusavam pertencer.
"Geração" essa que eles viram, com curiosidade e algum desprezo, pôr a tralha às costas e partir sem destino. Anos mais tarde, uma vez regressados, atulhados de tudo quanto haviam recusado e abandonado, não faziam senão cobrir-se de ridículo. Vivendo no sossego falso de apartamentos "estilo humilde"(banquinhos de madeira e almofadas no chão, reproduções de budas espalhadas desde o wc ao quarto), rodeados de filhos e animais de estimação, davam-se ao trabalho de inculcar, tanto a uns como a outros, novos preceitos morais e uma boa dose de ecologia tonta. Eram peritos em discursos santos e tristonhos, advertindo à força as crias vegetarianas contra os inúmeros pecados da carne.
Para Beno e os amigos, era precisamente a fúria de tudo desejar e ter imediatamente que os impedia de soçobrar na vulgaridade e na norma. Os outros pareciam acomodar-se num estado morto-vivo, enquanto eles iam morrendo a cada instante. Lúcidos e atentos, mesmo quando a loucura lhes roubou Zohía, e a morte embarcou Kid num esquife de treva e dor.
In Lunário, Alberto
quinta-feira, 2 de agosto de 2007
Aqui. Hoje.
A poeira elementar que nos ignora
e que foi o ruivo Adão e que é agora
todos os homens e que não veremos.
Já somos na tumba as duas datas
do princípio e do término, o esquife,
a obscena corrupção e a mortalha,
os ritos da morte e as elegias.
Não sou o insensato que se aferra
ao mágico sonido de teu nome:
penso com esperança naquele homem
que não saberá que fui sobre a Terra.
Embaixo do indiferente azul do céu
esta meditação é um consolo.
Jorge Luís Borges
quarta-feira, 1 de agosto de 2007
terça-feira, 31 de julho de 2007
quarta-feira, 25 de julho de 2007
crescente
segunda-feira, 23 de julho de 2007
quinta-feira, 19 de julho de 2007
segunda-feira, 16 de julho de 2007
Outono

By Joy Robin Owen
domingo, 15 de julho de 2007
ousarão os corpos?

By Geoffroy Demarquet
"diluído no esquecimento reconstrói-se o lugar
por onde regressámos ao tempo das manhãs felizes
a obra progride sob a cinza clara da noite
que fica entre nós fingimos não doer e partilhámos
nada sobreviverá depois do sono
e o mar essa revelação
já não traz a trémula alegria dos corpos
o sol parece um vidro sulcando
o rosto que as palavras tentam imitar
muito pouco sobejará dos repetidos gestos
talvez fique o consolo de ter apercebido uma lua
ou o rastro dum anjo escapando à loucura do sonho
lúcido e apaixonado
debruço-me para o papel onde a escrita se regenera
na chuva e nos ventos demorados como desgostos
e os corpos ousarão alguma vez permanecer vivos?
sossegados?"
In O Medo, Al Berto
sexta-feira, 13 de julho de 2007
Poema Pouco Original do Medo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no teto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos
O medo vai ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles
Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados
Ah o medo vai ter tudo
tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)
O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos
Sim a ratos
Alexandre O´Neil
quinta-feira, 12 de julho de 2007
Procura...
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha."
Eugénio de Andrade
segunda-feira, 9 de julho de 2007
quinta-feira, 5 de julho de 2007
Veludo
Dos gritos, que ouvia, ela nada sabia. As pernas carregadas de marcas negras. O ofício a toldar-lhe a razão que restava. No braço, pendurada, uma carteira dourada. Pequena, suficiente, repleta.
Dos seus gritos, que não ouvia, sabia pouco. Pouco de mais para os calar!
Filipa Rodrigues
Desafio de uma semana
sem me impressionar com o vidro sujo
sem lamentar o pesar dos passos
sem resistir ao apelo do sol
se pela porta saio
ao teu encontro
depois do escuro chegar
se no dia em que pelas escadas rolar
a minha consciência
a minha força
o meu talento de te fazer rir
desaparecer
pouco me importa
pouco me importa o porquê…
Filipa Rodrigues
segunda-feira, 2 de julho de 2007
domingo, 1 de julho de 2007
sábado, 30 de junho de 2007
Mark Rothko
Amarelo, laranja, limão,
depois o carmim: tudo arde
nas areias
entre as palmeiras e o mar - era verão.
Mas no lugar do teu nome
a terra tem a cor do verde
pensativo, que só a noite
pastoreia leve. "
In Os Sulcos da Sede, Eugénio de Andrade
sexta-feira, 29 de junho de 2007
Alprendre
os ângulos do tempo assumem
o contorno voo das gaivotas
sobressalta-me o azul
(pétalas de fogo poente)
jorge casimiro
dentro do fogo que se explana
a imensidão do espaço negro
a rotação eterna da terra
sobressalta-me o azul
(espinhos de vermelho rosáceo)
Filipa Rodrigues
quinta-feira, 28 de junho de 2007
quarta-feira, 27 de junho de 2007
Ventos...
Adormeça sobre o lago
Fala em silencio com os teus
Luminosos olhos
Banha de prata o crepúsculo
E de repente
Te retiras enquanto lobo
E o leão o escuro bosque espreita"
William Blake
segunda-feira, 25 de junho de 2007
sábado, 23 de junho de 2007
Sonhar acordado...
"Era essencialmente uma contradição, como se costuma dizer. As pessoas consideram-me sério e magnânimo, ou alegre e estouvado, ou sincero e fervoroso, ou negligente e descuidado. Era todas essas coisas ao mesmo tempo e, para além delas, era mais alguma coisa, alguma coisa de que ninguém suspeitava e eu menos do que toda a gente. Aos seis ou sete anos costumava sentar-me à bancada do meu avô e ler-lhe enquanto ele cosia. lembro-me vivamente do meu avô nos momentos em que, comprimindo o ferro quente contra a costura de um casaco, parava, de pé, com uma das mãos por cima da outra, na pega do ferro, e olhava pela janela, sonhadoramente. Lembro-me melhor da expressão do seu rosto, quando sonhava assim, do que do conteúdo dos livros que lia, das conversas que tínhamos ou das minhas brincadeiras na rua. Costumava perguntar a mim mesmo que sonharia ele, que seria que o levava para fora de si próprio. Por mim, ainda não aprendera a sonhar acordado, estava sempre lúcido, no momento presente e todo inteiro. Mas o sonhar do meu avô fascinava-me. Sabia que ele não tinha qualquer relação com o que estava a fazer, que não dedicava o mínimo pensamento a nenhum de nós, que estava sozinho e, estando sozinho, era livre. Eu nunca estava sozinho, principalmente quando não me encontrava com mais ninguém."
In Trópico de Capricórnio, Henry Miller
quinta-feira, 21 de junho de 2007
Sobre um poema
Ausência
na distância palpável das ondas
na paisagem sonâmbula dos dias
nos vazios de perfume que deixaste
e da essência dos rastos amanhecidos
só o gesto líquido da ausência
Jorge Casimiro
e nos dias desertos do teu corpo
sempre adiante
como proa emproada
via-te
na seiva do vento molhado
na luz lânguida a pôr-se
Filipa Rodrigues
Dizem que a paixão o conheceu...
mas hoje vive escondido nuns óculos escuros
senta-se no estremecer da noite
enumera o que lhe sobejou do adolescente
rosto turvo pela ligeira náusea da velhice
conhece a solidão de quem permanece acordado
quase sempre estendido ao lado do sono
pressente o suave esvoaçar da idade
ergue-se para o espelho
que lhe devolve um sorriso tamanho do medo
dizem que vive na transparência do sonho
à beira-mar envelheceu vagarosamente
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria
nenhum ofício cantante o tenha convencido
a permanecer entre os vivos
Al Berto
quarta-feira, 20 de junho de 2007
Crespúsculo

Mas para mim, que não sei o que penso,
terça-feira, 19 de junho de 2007
segunda-feira, 18 de junho de 2007
domingo, 17 de junho de 2007
Pai!
In Morreste-me, José Luís Peixoto
sexta-feira, 15 de junho de 2007
Vergílio Ferreira
Não há como é que, há só o ter chegado, que é que interessa? Não me sinto confortável em parte nenhuma do meu ser, o meu erro é orgânico e não é assim erro nenhum. Mas não me sinto bem nele, devo ter nascido em mim por engano. E de súbito. (…)””
In Até ao Fim, Virgílio Ferreira
* Este texto foi-nos enviado pelo Ricardo, aqui fica... como gesto de agradecimento a um amigo!
quinta-feira, 14 de junho de 2007
Presente!
Se fosse menino
A agenda vermelha em cima da mesa, pronta para se dedicar a um extenso deambular de emoções. As calças sujas de tinta e ferrugem, depois de manusear o espeto de ferro que perfurou os frascos coloridos. As mãos trémulas, os pés frios, a cabeça a latejar sem destino e com aflição. Nas pernas a pressão e as nódoas negras da noite passada.
Seguia sem olhar para o traço, sem preparar a massa, sem orientar as ideias. Uma longa e desajeitada dança em torno de objectos ainda disformes.
“Se fosse menino ia para a rua jogar futebol com os outros”, pensou.
Filipa Rodrigues
terça-feira, 12 de junho de 2007
Tempo sem espaço
E, às voltas, como que a subir e descer escadas, fizemos buracos no jardim e fechamos tudo com tábuas.
E lemos tudo. E esquecemos os sons da estrada e dos cafés. E quisemos ser e não e voltar a moer grãos de ouro e prata.
E nós… E eles… e ninguém mais solto ou amarrado, ou vivo ou morto!
Longe as palavras que dissemos. Perto os objectos que largamos.
Tudo no início da linha, como sempre!
Filipa Rodrigues
Somos...
porque o mais, por estar realizado,
pertence ao mundo e a toda a gente.
In O Livro do Desassossego, Bernardo Soares
domingo, 10 de junho de 2007
Da Maneira Mais Simples

sexta-feira, 8 de junho de 2007
Vozes...
O lápis que grita
A cor ausente
Os hemisférios desencontrados
As vozes que não se calam
As vozes que se tornaram inaudíveis
O lume que se extingue
As lareiras de cinza
Entre copos vazios
E corpos ausentes…
Sara Gonçalves
Ensaio para um texto
A fuga transitória para um presente que não se pretende completar.
P. levantou-se e deixou-se cair sobre si própria. “Mau ensaio para um novo texto.”
Filipa Rodrigues